segunda-feira, 22 de julho de 2013

Reflexões sobre o PL de Iniciativa Popular “Por uma Mídia Democrática”

A Coordenação Executiva do Comitê Estadual do FNDC Alagoas, após estudo e discussão do texto do Projeto de Lei de Iniciativa Popular “Por uma Mídia Democrática”, apresenta algumas considerações para subsidiar as reflexões acerca das propostas contidas no referido PL. Entre as observações, percebemos algumas lacunas e conflito de competência entre o Ministério das Comunicações (Minicom), a Agência Nacional de telecomunicações (Anatel) e a Agência Nacional de Cinema (Ancine) quanto ao desempenho legal de algumas atribuições, entre outras questões relevantes, conforme especificado abaixo:


Artigo 2 – Para efeito desta lei, considera-se:

I - Comunicação social eletrônica: as atividades de telecomunicações ou de radiodifusão que possibilitam a entrega de programação audiovisual ou de rádio em qualquer plataforma, com as seguintes características:

a) fluxo de sinais predominantemente no sentido da emissora, prestadora ou operadora para o usuário;
b) conteúdo da programação não gerado pelo usuário; e
c) escolha do conteúdo das transmissões realizada pela prestadora do serviço, seja como grade de programação, seja como catálogo limitado de oferta de programação".


O processo de migração para o sistema digital, onde a convergência tecnológica garante as transmissões de dados, tanto do emissor para o receptor, quanto do receptor para o emissor, o PL em nenhum momento faz menção às novas possibilidades de interatividade, contentando-se apenas em regular a transmissão de áudio ou vídeo (radiodifusão), onde o fluxo de dados é unilateral, ou seja, das cabeças de rede e emissoras para os (tele) espectadores.

Artigo 6 – Fica criado o Fundo Nacional de Comunicação Pública, com o objetivo de apoiar a sustentabilidade das emissoras do sistema público.

Não fica evidente a que órgão o Fundo será vinculado e quem o administrará. O PL não faz referência à alocação de recursos públicos destinados à publicidade institucional para a sustentabilidade das emissoras públicas. 

Artigo 7 – As emissoras de televisão terrestre e de rádio deverão transmitir sua programação por meio de um operador de rede.

§ 1º - Caberá ao operador de rede organizar as programações das emissoras nos canais a ele outorgados pela Agência Nacional de Telecomunicações e assegurar a difusão dessas até a casa dos usuários em condições técnicas adequadas, bem como oferecer seu serviço às prestadoras de serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, em condições justas, isonômicas e não discriminatórias.
§ 3º - Cabe a Anatel organizar e conduzir as licitações para a concessão onerosa de frequência a operadores de rede.

Nesse Artigo existe um conflito de competência entre o Minicom e Anatel. Quais os fundamentos para transferir prerrogativas do Minicom para a Anatel? Essa Agência acumulará as funções de poder concedente, poder de fiscalização e de punição? Até que ponto isso é conveniente e produtivo ou trará mudanças benéficas para a democratização da comunicação?

O projeto político de transformar a Anatel em uma mega Agência foi engendrado no final da década de noventa do século passado pelo PSDB (partido da Social Democracia Brasileira), através do Ministro das Comunicações, Sérgio Mota, que à época foi rechaçado pela sociedade. Sérgio Mota pretendia mudar o nome da Anatel para Anacom (Agência nacional de Comunicação) que concentraria os setores de telecomunicações, radiodifusão e os correios.  

Fica a pergunta: qual o mérito de se resgatar esse projeto e contemplá-lo nesse PL? O Minicom é um espaço de lobby político. Já a Anatel é um espaço de lobby tecnológico e econômico, pois quem detém o poder econômico detém a tecnologia.

Portanto, esse PL é anacrônico, pois não trás respostas para os desafios postos pela digitalização e a consequênte implantação do novo Sistema de TV Digital no Brasil. Também é reacionário, foi ressuscita tentativas de regulamentação e normatização que se pretendiam superadas, pois não contemplam os interesses do conjunto da sociedade.
 
Artigo 9 – Cabe à Ancine organizar e conduzir as licitações para outorga onerosa de programação a emissoras, conforme a disponibilidade de distribuição de frequências entre os sistemas e obedecendo aos seguintes princípios.

Quais os poderes da Ancine? Existe competência legal para a Ancine desenvolver essa nova função? Há interesse do setor cinematográfico em que seja transferida para a Ancine essa competência?

Artigo 11 – Na utilização das outorgas de rádio e televisão terrestre, é vedada:
I - A cessão onerosa ou o arrendamento das prestadoras de serviços de comunicação social eletrônica, bem como de horários de sua grade de programação;

Até que ponto essa medida afeta a sustentabilidade das empresas. Senão o pagamento pelo horário, que critérios serão aplicados para exibição de conteúdos independentes e/ou de terceiros na grade de programação das emissoras?

Artigo 15 – O mesmo grupo econômico não poderá ser contemplado com outorgas do mesmo tipo de serviço de comunicação social eletrônica que ocupem mais de 3% do espectro reservado àquele serviço na mesma localidade.

O percentual de 3% não tem fundamento matemático; quantas emissoras terão que existir na localidade para esse percentual ser aplicado?

Artigo 16 –
Parágrafo 1º – Nas cidades com 100 mil habitantes ou menos, um mesmo grupo poderá explorar mais de um serviço de comunicação social eletrônica ou manter o serviço e a publicação de jornal diário desde que um dos veículos de comunicação não esteja entre os três de maior audiência ou tiragem.

No Brasil não existe legislação que controle a publicação de jornal impresso. Qual fundamento legal para incluir esse controle nesse PL? Que resultados ou benefícios isso trará de fato para a democratização da comunicação e para a sociedade?

Artigo 17 - As emissoras de televisão terrestre e rádio não poderão manter média anual de participação em receita de venda de publicidade e conteúdo comercial superior em 20% à sua participação na audiência, considerados critérios e mercados relevantes definidos em regulamento.

Esse Artigo nega a lei da livre concorrência, o fundamento do sistema capitalista. Como justificar, no atual sistema econômico, a limitação de faturamento de uma empresa? O que tem que ser limitado é o percentual de aplicação de verbas públicas, nos três níveis de poder, nas empresas de comunicação.

Artigo 23 - Pelo menos 50% das outorgas de rádio em cada localidade devem ser reservadas a emissoras que veiculem no mínimo 70% de conteúdo brasileiro.

A reserva de tempo para conteúdo nacional já demonstra subserviência cultural. O que tem de ser limitado é o percentual de conteúdo estrangeiro.

Artigo 24 - A programação dos serviços de comunicação social eletrônica deverá respeitar os princípios e objetivos definidos no artigo 4.

Parágrafo 3º, item 6 - VI. Promova proselitismo político, a não ser em conteúdo jornalístico e no horário eleitoral e reservado aos partidos políticos;

O PL trata conteúdo jornalístico e proselitismo político em horário eleitoral da mesma forma e no mesmo nível. A quem convém isso?

Artigo 25 - O direito de resposta nos serviços de comunicação social eletrônica deve ser garantido de forma individual, coletiva ou difusa9 a todas as pessoas físicas ou jurídicas que forem acusadas ou ofendidas em sua honra ou a cujo respeito for veiculado fato inverídico ou errôneo em meios de comunicação. O espaço dado deve ser gratuito, igual ao utilizado para a acusação ou ofensa. O pedido de resposta deve ser atendido em até 48 horas após o recebimento da reclamação, após o que pode haver reclamação ao órgão regulador, que terá o poder de concedê-lo administrativamente.

Vale apena, nesse PL, tocar no assunto crime de imprensa sem profundidade? Ou o PL trata da questão da regulação dos crimes de imprensa de forma contundente ou retira-se esse tema do texto. Da forma superficial como está colocada mais prejudica que contribui para o avanço do tema. A regulação das questões vinculadas aos crimes de imprensa não deveriam ser tratadas em PL específico, com detalhamento de todas as nuances que o tema requer? A OAB, a Fenaj, a Fitert e outras Federações e os Sindicatos das diversas categorias de Comunicação Social foram ouvidos?

 Artigo 29 - É criado o Conselho Nacional de Políticas de Comunicação como órgão independente, mantido pelo Poder Executivo, de promoção de direitos públicos e difusos, com atribuição de zelar pelo cumprimento dos princípios e objetivos definidos no artigo 4º e acompanhar e avaliar a execução das políticas públicas e da regulação do setor.
V - Organizar quadrienalmente a Conferência Nacional de Comunicação;

Por que não realizar a CONFECOM de forma bienal ou trienal?

§  2º – O Conselho Nacional de Políticas de Comunicação será composto por 28 membros, e terá a seguinte composição12:

I - 7 representantes do Poder Executivo, sendo um do Ministério das Comunicações, um do Ministério da Cultura, um do Ministério da Educação, um do Ministério da Justiça, um da Secretaria de Direitos Humanos, um da Anatel e um da Ancine;
II - 3 representantes do Poder Legislativo, sendo um do Senado, um da Câmara dos Deputados e um do Conselho de Comunicação Social;
III - 1 representante da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão;
IV - 4 representantes dos prestadores dos serviços de comunicação social eletrônica;
V - 4 representantes das entidades profissionais ou sindicais dos trabalhadores;
VI - 4 representantes da comunidade acadêmica, instituições científicas e organizações da sociedade civil com atuação no setor;
VII - 4 representantes de movimentos sociais representativos de mulheres, negros, indígenas, população LGBT e juventude;
VIII - O Defensor dos Direitos do Público, que passa a compor o Conselho depois de ser nomeado por este.


Um Conselho de Comunicação que não garante representação dos trabalhadores do setor, como irá contemplar as entidades profissionais representativas dos jornalistas, radialistas, publicitários, relações públicas, cinema? O PL deve garantir número mínimo de vagas para representação dessas categorias. 

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