A Coordenação Executiva
do Comitê Estadual do FNDC Alagoas, após estudo e discussão do texto do Projeto
de Lei de Iniciativa Popular “Por uma Mídia Democrática”, apresenta algumas
considerações para subsidiar as reflexões acerca das propostas contidas no referido
PL. Entre as observações, percebemos algumas lacunas e conflito de competência
entre o Ministério das Comunicações (Minicom), a Agência Nacional de
telecomunicações (Anatel) e a Agência Nacional de Cinema (Ancine) quanto ao
desempenho legal de algumas atribuições, entre outras questões relevantes, conforme
especificado abaixo:
Artigo 2 – Para efeito desta lei, considera-se:
I - Comunicação
social eletrônica: as atividades de telecomunicações ou de radiodifusão que
possibilitam a entrega de programação audiovisual ou de rádio em qualquer
plataforma, com as seguintes características:
a) fluxo de sinais predominantemente no sentido da emissora, prestadora ou operadora para o usuário;
b) conteúdo da programação não gerado pelo usuário; e
c) escolha do conteúdo das transmissões realizada pela prestadora do serviço, seja como grade de programação, seja como catálogo limitado de oferta de programação".
O processo de
migração para o sistema digital, onde a convergência tecnológica garante as transmissões de dados, tanto do emissor para o receptor, quanto do receptor
para o emissor, o PL em nenhum momento faz menção às novas possibilidades de
interatividade, contentando-se apenas em regular a transmissão de áudio ou
vídeo (radiodifusão), onde o fluxo de dados é unilateral, ou seja, das cabeças
de rede e emissoras para os (tele) espectadores.
Artigo 6 – Fica criado o Fundo Nacional de Comunicação Pública, com o objetivo de
apoiar a sustentabilidade das emissoras do sistema público.
Não fica evidente a que órgão o Fundo será vinculado e quem o administrará.
O PL não faz referência
à alocação de recursos públicos destinados à publicidade institucional para a
sustentabilidade das emissoras públicas.
Artigo 7 – As emissoras de televisão terrestre e de rádio
deverão transmitir sua programação por meio de um operador de rede.
§ 1º - Caberá ao
operador de rede organizar as programações das emissoras nos canais a ele
outorgados pela Agência Nacional de Telecomunicações e assegurar a difusão
dessas até a casa dos usuários em condições técnicas adequadas, bem como
oferecer seu serviço às prestadoras de serviço de radiodifusão sonora e de sons
e imagens, em condições justas, isonômicas e não discriminatórias.
§ 3º - Cabe a Anatel
organizar e conduzir as licitações para a concessão onerosa de frequência a
operadores de rede.
Nesse Artigo existe um conflito de competência entre o Minicom e
Anatel. Quais os fundamentos para transferir prerrogativas do Minicom para a
Anatel? Essa Agência acumulará as funções de poder concedente, poder de
fiscalização e de punição? Até que ponto isso é conveniente e produtivo ou
trará mudanças benéficas para a democratização da comunicação?
O projeto político de transformar a Anatel em uma mega Agência
foi engendrado no final da década de noventa do século passado pelo PSDB
(partido da Social Democracia Brasileira), através do Ministro das
Comunicações, Sérgio Mota, que à época foi rechaçado pela sociedade. Sérgio
Mota pretendia mudar o nome da Anatel para Anacom (Agência nacional de
Comunicação) que concentraria os setores de telecomunicações, radiodifusão e os
correios.
Fica a pergunta: qual o mérito de se resgatar esse projeto e
contemplá-lo nesse PL? O Minicom é um espaço de lobby político. Já a Anatel é
um espaço de lobby tecnológico e econômico, pois quem detém o poder econômico
detém a tecnologia.
Portanto, esse PL é
anacrônico, pois não trás respostas para os desafios postos pela digitalização
e a consequênte implantação do novo Sistema de TV Digital no Brasil. Também é
reacionário, foi ressuscita tentativas de regulamentação e normatização que se
pretendiam superadas, pois não contemplam os interesses do conjunto da
sociedade.
Artigo 9 – Cabe à Ancine organizar e conduzir as
licitações para outorga onerosa de programação a emissoras, conforme a
disponibilidade de distribuição de frequências entre os sistemas e obedecendo
aos seguintes princípios.
Quais os poderes da Ancine? Existe competência legal para a
Ancine desenvolver essa nova função? Há interesse do setor cinematográfico em
que seja transferida para a Ancine essa competência?
Artigo 11 – Na utilização das outorgas de rádio e
televisão terrestre, é vedada:
I
- A cessão onerosa ou o arrendamento das prestadoras de serviços de comunicação
social eletrônica, bem como de horários de sua grade de programação;
Até que ponto essa medida afeta a sustentabilidade das empresas.
Senão o pagamento pelo horário, que critérios serão aplicados para exibição de
conteúdos independentes e/ou de terceiros na grade de programação das emissoras?
Artigo 15 – O mesmo grupo econômico não poderá ser
contemplado com outorgas do mesmo tipo de serviço de comunicação social
eletrônica que ocupem mais de 3% do espectro reservado àquele serviço na mesma
localidade.
O percentual de 3% não tem fundamento matemático; quantas
emissoras terão que existir na localidade para esse percentual ser aplicado?
Artigo 16 –
Parágrafo 1º – Nas
cidades com 100 mil habitantes ou menos, um mesmo grupo poderá explorar mais de
um serviço de comunicação social eletrônica ou manter o serviço e a publicação
de jornal diário desde que um dos veículos de comunicação não esteja entre os
três de maior audiência ou tiragem.
No Brasil não existe legislação que controle a publicação de jornal
impresso. Qual fundamento legal para incluir esse controle nesse PL? Que
resultados ou benefícios isso trará de fato para a democratização da
comunicação e para a sociedade?
Artigo 17 - As emissoras de televisão terrestre e
rádio não poderão manter média anual de participação em receita de venda de
publicidade e conteúdo comercial superior em 20% à sua participação na
audiência, considerados critérios e mercados relevantes definidos em
regulamento.
Esse Artigo nega a lei da livre concorrência, o fundamento do
sistema capitalista. Como justificar, no atual sistema econômico, a limitação
de faturamento de uma empresa? O que tem que ser limitado é o percentual de
aplicação de verbas públicas, nos três níveis de poder, nas empresas de
comunicação.
Artigo 23 - Pelo menos 50% das outorgas de rádio em
cada localidade devem ser reservadas a emissoras que veiculem no mínimo 70% de
conteúdo brasileiro.
A reserva de tempo para conteúdo nacional já demonstra
subserviência cultural. O que tem de ser limitado é o percentual de conteúdo
estrangeiro.
Artigo 24 - A programação dos serviços de comunicação
social eletrônica deverá respeitar os princípios e objetivos definidos no
artigo 4.
Parágrafo 3º, item 6 -
VI. Promova proselitismo político, a não ser em conteúdo jornalístico e no
horário eleitoral e reservado aos partidos políticos;
O PL trata conteúdo jornalístico e proselitismo político em
horário eleitoral da mesma forma e no mesmo nível. A quem convém isso?
Artigo 25 - O direito de resposta nos serviços de
comunicação social eletrônica deve ser garantido de forma individual, coletiva
ou difusa9 a todas as pessoas físicas ou jurídicas que forem acusadas ou
ofendidas em sua honra ou a cujo respeito for veiculado fato inverídico ou
errôneo em meios de comunicação. O espaço dado deve ser gratuito, igual ao
utilizado para a acusação ou ofensa. O pedido de resposta deve ser atendido em
até 48 horas após o recebimento da reclamação, após o que pode haver reclamação
ao órgão regulador, que terá o poder de concedê-lo administrativamente.
Vale apena, nesse PL, tocar no assunto crime de imprensa sem profundidade?
Ou o PL trata da questão da regulação dos crimes de imprensa de forma contundente
ou retira-se esse tema do texto. Da forma superficial como está colocada mais
prejudica que contribui para o avanço do tema. A regulação das questões
vinculadas aos crimes de imprensa não deveriam ser tratadas em PL específico,
com detalhamento de todas as nuances que o tema requer? A OAB, a Fenaj, a
Fitert e outras Federações e os Sindicatos das diversas categorias de
Comunicação Social foram ouvidos?
Artigo
29 - É criado o Conselho Nacional de Políticas de Comunicação como órgão
independente, mantido pelo Poder Executivo, de promoção de direitos públicos e
difusos, com atribuição de zelar pelo cumprimento dos princípios e objetivos
definidos no artigo 4º e acompanhar e avaliar a execução das políticas públicas
e da regulação do setor.
V -
Organizar quadrienalmente a Conferência Nacional de Comunicação;
Por que não realizar a CONFECOM de forma bienal ou
trienal?
§ 2º – O Conselho Nacional de Políticas de
Comunicação será composto por 28 membros, e terá a seguinte composição12:
I - 7 representantes do
Poder Executivo, sendo um do Ministério das Comunicações, um do Ministério da
Cultura, um do Ministério da Educação, um do Ministério da Justiça, um da
Secretaria de Direitos Humanos, um da Anatel e um da Ancine;
II - 3 representantes do
Poder Legislativo, sendo um do Senado, um da Câmara dos Deputados e um do
Conselho de Comunicação Social;
III - 1 representante da Procuradoria
Federal dos Direitos do Cidadão;
IV - 4 representantes dos
prestadores dos serviços de comunicação social eletrônica;
V - 4 representantes das entidades
profissionais ou sindicais dos trabalhadores;
VI - 4 representantes da
comunidade acadêmica, instituições científicas e organizações da sociedade
civil com atuação no setor;
VII - 4 representantes de
movimentos sociais representativos de mulheres, negros, indígenas, população
LGBT e juventude;
VIII
- O Defensor dos Direitos do Público, que passa a compor o Conselho depois de
ser nomeado por este.
Um Conselho de Comunicação que não garante representação dos
trabalhadores do setor, como irá contemplar as entidades profissionais
representativas dos jornalistas, radialistas, publicitários, relações públicas,
cinema? O PL deve garantir número mínimo de vagas para representação dessas
categorias.
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